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Poucas & Boas nº 110: Onde está a mudança?

Produção mundial de antibióticos está paralisada e ameaça a saúde

A indústria reduziu lançamentos e as superbactérias proliferam. Especialistas alertam sobre impacto desse descompasso no tratamento de infecções
Fernanda Aranda – do portal iG de São Paulo
Produção de antibióticos cai e superbactérias crescem no mundo
A baixa produção de antibióticos ameaça a humanidade
Duas velocidades incompatíveis ameaçam o tratamento mundial de doenças causadas por bactérias. Ao mesmo tempo em que a indústria farmacêutica do planeta reduziu a produção de novos antibióticos, os casos de bactérias multirresistentes aos remédios disponíveis estão em plena aceleração. Os números já alarmaram a Organização Mundial de Saúde (OMS) que, em relatório divulgado no ano passado, informou: oito das 15 farmacêuticas produtoras de antibióticos perderam o interesse em atuar na elaboração de fármacos mais potentes. Os dados, publicados em artigo na revista The Economist, contabilizam o prejuízo. “Entre 1983 e 1992, as agências reguladoras de novos medicamentos aprovaram 30 drogas do tipo. Desde 2003, no entanto, apenas sete antibióticos chegaram ao mercado”. Enquanto isso, as autoridades sanitárias, incluindo a do Brasil, registram o aparecimento veloz de bactérias causadoras de pneumonias e outras doenças que simplesmente não reagem às medicações existentes, como os últimos casos registrados em unidades de terapia intensiva (UTI) de Porto Alegre (Rio Grande do Sul). O ideal, afirmam os especialistas, seria investir em tratamentos pioneiros para vencer os agentes bacterianos multirresistentes e que provocam mortes, características de 20, 2% das bactérias que circulam no Brasil , conforme atestou o estudo internacional chamado Sentry, feito com base em 325 amostras de bactérias do pneumococo que circulam no País. A falta de novidades terapêuticas impede, no entanto, este tipo de investida e deixa os médicos com pouca munição para tratar as doenças bacterianas líderes em causa de internação. Um levantamento feito pelo iG no banco de dados do Ministério da Saúde indica que são, em média, 1.300 internações diárias em hospitais públicos acumuladas só por causa da pneumonia .
Apelo
Com esta realidade clínica, um grupo de especialistas de diversas nacionalidades, entre eles a médica brasileira Rosana Richtmann, publicou um apelo na revista médica The Lancet alertando que “um dos tesouros da medicina” está ameaçado de extinção. “Apelamos aos nossos colegas em todo o mundo para assumir a responsabilidade para a proteção desse precioso recurso [os antibióticos]. Não há mais tempo para o silêncio e a complacência”, diz o manifesto divulgado em 2011. Dois anos se passaram desde a convocação feita pelo Lancet e o quadro crítico não foi alterado, lamenta Richtmann, do Instituto de Infectologia Emílio Ribas e do comitê de Imunização do Ministério da Saúde e da Sociedade Brasileira de Imunizações (Sbim). “Acabo de voltar de um congresso na Europa muito preocupada e desanimada. Não tivemos nenhum lançamento de impacto no cenário dos antibióticos em 2012”, afirmou ela. “As informações são de que não temos nada programado para 2013. Assim, ficamos de mão atadas”, completou.
A origem
Marcos Antonio Cyrillo, diretor da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), pontua os fatores que contribuem para a letargia industrial na produção de novos antibióticos. Segundo ele, os medicamentos desta classe são usados por pouco tempo, mas exigem ao menos 10 anos de pesquisa. Diferentemente dos remédios para doenças no coração, que serão usados a vida toda, eles agem em problemas pontuais, revertidos em poucas semanas. Além disso, as patentes que regem a exclusividade na produção são expiradas após cinco anos, o que desestimula o investimento financeiro. Somado a este contexto, está o mau uso dos antibióticos, tanto por parte dos médicos quanto da população. Prescrever medicamentos deste tipo para doenças causadas por vírus ou parar o tratamento antes do prazo acelera o processo que faz a bactéria virar multirresistente. Isso torna, em poucos anos, o antibiótico obsoleto. “O poder público, as universidades e as sociedades médicas deveriam estabelecer programas de cooperação para pesquisa, pois temos os profissionais capacitados, tecnologia adequada e os pacientes-alvo dos estudos científicos”, acredita Cyrillo. Sem os novos fármacos e sem a mudança de hábitos por parte da população – que além da prescrição responsável também exige medidas de higiene, como lavar as mãos – as bactérias ficarão ainda mais protegidas e os pacientes cada vez mais vulneráveis.
Novas e velhos
Enquanto novas bactérias só contam com velhos antibióticos, os médicos recorrem a alquimias, esperando efeito positivo. “Nestes casos, utilizamos associações de antibióticos, aumentamos as doses e utilizamos princípios de farmacocinética e farmacodinâmica”, explica Cyrillo sobre os processos que buscam otimizar doses e tempo de duração. A esperança para mudar o contexto vem do aperfeiçoamento das técnicas preventivas às doenças bacterianas, como novas vacinas que impedem a contaminação por microrganismos bacterianos, transmitidos pelo ar. Segundo os especialistas, vem também da iniciativa das pessoas de atentarem para a importância de que lavar as mãos salva vidas e de que o tesouro da medicina chamado antibiótico precisa ser usado com cautela.

Escadarias do Copan estimulam apetite sexual

Casal é flagrado transando nos degraus de acesso do Copan, em SP
ROBERTO DE OLIVEIRA – da Folha de São Paulo
Edifício famoso do centro de São Paulo parece estimular o apetite sexual! 
(foto: armonte.wordpress.com)
Quanto vale uma transa? Nas escadarias de um dos edifícios mais populosos do Brasil, o Copan, custou R$ 678. Esse é o valor da multa que a administração do prédio, um dos cartões-postais paulistanos, emitiu ao proprietário de um apartamento do bloco E, ocupado por imóveis de um quarto e quitinetes. O apê estava alugado. A inquilina emprestou o imóvel para uma amiga do Rio de Janeiro. Esta recebeu um casal de visitantes. Os dois se identificaram na portaria do edifício e pegaram o elevador. Câmeras de segurança flagraram a saída deles, que, no lugar de seguirem em direção ao apartamento, mudaram de rumo: foram para as escadas externas de acesso ao terraço. Desconfiado, o segurança resolveu ir atrás. Encontrou os dois lá no alto bem na "hora H". As câmeras pegaram o casal arrumando as roupas. A transa rolou no último dia 27, às 22h20. Sob a condição de anonimato, a garota que fez sexo na escadaria conversou com a Folha. "Entrei numa área livre, não quebrei a porta, não incomodei ninguém. Quando o segurança chegou, parei o que estava fazendo e fui embora", conta. "É ridícula essa situação de moralismo, de patrulha da vida alheia. Quem nunca transou num local público?" Oi? "Tá bom, a diferença é que fui pega", diz. A garota, que mora no Rio, conta que já pagou o valor da multa para a amiga inquilina. "Que chato! Ela foi advertida. Temo por represálias."
VAQUINHA
Para tentar minimizar o estrago na conta bancária, a garota da escada criou uma página chamada "peripécias no Copan", no site Vakinha. Como o próprio nome indica, o vakinha.com.br é usado por internautas para levantar uma grana para as mais variadas causas. Nele, a carioca se identifica com o nome fictício de Alana Milesi, 25. Escreveu: "Aprontei um pouco demais da conta e acabei recebendo uma multa de R$ 678 por transar no último andar do Copan. Agora quero ver vocês pingarem e ajudarem uma amiga que foi penalizada pelo universo apenas pelo fato de ser 'transona'". Até ontem à noite, a página tinha cerca de 9.000 visitas. Balanço da "sacolinha"? R$ 20 --a confirmar. Comentários pipocaram pela web. No próprio site: "Façam uma outra vaquinha para um motel, porque nem nas escadas se pode transar em paz mais. Valeu e bom sexo". O assunto, é claro, também caiu nas redes sociais. No Facebook: "Cobra do cara que te catou... Pelo menos, 50%". No Twitter: "Multa por transar é sacanagem". A garota está esperançosa. "Isso já deu tanta dor de cabeça. Podiam ao menos dar uma contribuída. Fala sério, minha causa é nobre", gaba-se. Para o síndico do Copan, Affonso Celso Prazeres de Oliveira, 73, o ato "é simplesmente depreciativo". "Que foda cara! Só dá para fazer piada", brinca. "E ainda na escada?" A multa, explica Oliveira, é por desrespeitar às normas do prédio.
ANTECEDENTES
Projetado nos anos 1950 por Oscar Niemeyer, o Copan enfrentou nos anos 1980 prostituição aberta nos corredores e tráfico de drogas. O prédio só foi colocado nos eixos graças ao trabalho incessante do síndico e também de quem vive por lá. Hoje, o edifício localizado no centro de São Paulo abriga 2.038 moradores, que ocupam 1.160 apartamentos distribuídos em seis blocos. "Quase ninguém aqui ficou sabendo dessa história da transa, mas, depois que o caso foi parar no Vakinha, bombou", conta Juliana Trento, 27, projetista, moradora do edifício. "Só se fala disso." Vale lembrar, no entanto, que essa não foi a primeira vez que as escadas do Copan tiveram uso indevido, Juliana. O síndico conta que, há três anos, um morador, proprietário do imóvel, foi expulso do edifício por transar nas escadas. Detalhe: duas vezes.

Bahia de sangue: Porto Seguro e cidades vizinhas se destacam em homicídios

Dados estão no mapa da violência na Bahia, preparado pelo CORREIO com base em registros de homicídios em 2012. Na nossa região, Nova Soure, Heliópolis e Itapicuru são os municípios mais violentos.
Alexandre Lyrio, Juan Torres e Rafael Rodrigues – do CORREIO
Antes, o vermelho sangue dos homicídios pintava Salvador e Região Metropolitana (RMS). Agora, porém, o Sul do estado ganha grande destaque nesse mapa da violência que o CORREIO preparou com base em dados da Secretaria da Segurança Pública (SSP). Um dos principais destinos turísticos do estado, Porto Seguro, é a cidade que registrou em 2012 a maior taxa de homicídios entre os municípios com mais de 100 mil habitantes (101,03), seguida por Eunápolis (96,46) e Teixeira de Freitas (90,21). As três ficam no Extremo Sul do estado.
Para se ter uma ideia, Salvador registrou, no ano passado, taxa de 58 homicídios por 100 mil habitantes e a Região Metropolitana,  historicamente  destaque nacional em violência, tem taxa média de 87 homicídios por 100 mil habitantes.
Ainda na região de Porto Seguro, na bela Alcobaça, por exemplo, não ocorreu sequer um homicídio em 2011. No ano seguinte foram 13.  Em Prado, a 25 km de Alcobaça, os números são idênticos. Em Mucuri, próximo, também houve 13 homicídios em 2012, contra apenas um em 2011. As três estão na lista das dez cidades do estado com maior crescimento de homicídios em 2012. “A droga chegou no interior através dos traficantes de fora. Como vou combater isso com um agente de polícia? Está quase chegando a ponto de afastar os visitantes”, diz o delegado de Alcobaça, Robson Marocci.
Paraísos
Até mesmo destinos turísticos cobiçados na região, como Trancoso e Arraial D’Ajuda, localidades que pertencem a Porto Seguro, veem suas praias paradisíacas serem manchadas de sangue. Os dados referentes a esses povoados incluem-se nos números de Porto Seguro e não estão separados no levantamento da SSP. Mas a delegacia de Arraial, que responde também por Trancoso, informou que somente esse ano 11 homicídios já foram registrados na região. “Metade deles foi cometida por gente de fora”, confirmou o delegado Rafael Zanini. “A PM instalou uma Base Comunitária de Segurança no complexo do Baianão, a área mais violenta de Porto Seguro. Aí muitos bandidos migraram para Cabrália, onde apenas dois PMs fazem a segurança diariamente. Foram também para Trancoso, também com dois PMs”, explicou o delegado, acrescentando que um homem conhecido como Carioca, do Rio, comandava até  pouco tempo o tráfico na região, antes de ser preso.
O coronel da reserva Jorge Melo, do Programa de Estudos, Pesquisas e Formação em Políticas e Gestão de Segurança Pública da Ufba, não acredita que traficantes em si  migrem entre cidades, mas sim numa “interiorização” do tráfico como atividade. “O tráfico está indo para o interior, até como novo nicho de mercado”, analisa. “Antes, os colegas daqui iam trabalhar na capital e voltavam horrorizados. Hoje, acontece o contrário. Quando vem o pessoal de Salvador fazer operação, fica impressionado com os crimes e o poder de fogo dos bandidos”, afirma Patrick Campos, coordenador da Associação dos Policiais Militares da Bahia (Aspra) em Porto Seguro.
Explicações
O CORREIO tentou entrar em contato com o Departamento de Polícia do Interior (Depin) e com a Coordenadoria de Eunápolis, da qual Porto Seguro faz parte, mas a assessoria da Polícia Civil informou que seus coordenadores estavam em viagem. O titular da 1ª Delegacia de Porto Seguro, Robson Andrade, disse que assumiu o cargo em abril deste ano e pouco poderia contribuir. “Com certeza esses índices já caíram. Só não tenho como apresentá-los agora”, disse. O Comando de Policiamento Regional do Sul da Bahia informou que tem realizado operações não só em Porto Seguro, mas em outras cidades. “Recentemente prendemos dezenas de líderes do tráfico em uma operação em Itabuna. Todas as cidades próximas sentem positivamente a ação”, disse o major Gilson Marinho. Já o comandante do 8º Batalhão (Porto Seguro), Valter Cerpa, disse que intensificou o policiamento e as ações especiais na cidade. “Em abril, realizamos 30 prisões”, destacou.
Ituberá
No Baixo Sul, ganha destaque a cidade de Ituberá, que registrou o maior crescimento em homicídios em todo o estado.  De apenas um homicídio em 2011, passou para 28 em 2012. Ituberá também aparece na segunda colocação entre os maiores índices de homicídio do estado, com 104 homicídios/100 mil habitantes. Titular da delegacia da cidade, Gil Félix informou que de janeiro a maio de 2012 ocorreram 13 assassinatos na cidade e em 2013 o número caiu para seis.   
Turismo
Procurada para repercutir possíveis impactos da violência no setor, a Secretaria de Turismo da Bahia (Setur) informou, em nota, que “o governo está atento à gravidade da questão e empenhado em reduzir os efeitos do tráfico de drogas e da criminalidade nestes municípios, com ações como o reforço do policiamento e implantação de bases comunitárias de segurança”. O comunicado afirma, com números atribuídos à SSP, que houve redução de homicídios no primeiro quadrimestre do ano em Porto Seguro (-28%), Itacaré (-60%) e Caravelas (-25%). Acrescenta que no período não foram registrados homicídios em Alcobaça e Prado.
O presidente da Associação Brasileira de Indústrias de Hotéis (Abih) da Costa do Descobrimento, que abrange Porto Seguro, Belmonte e Eunápolis, Siegfriend Michael, informou que Porto Seguro recebe 1,2 milhão de turistas por ano e R$ 1,5 bilhão de faturamento em negócios voltados ao turismo e que isso “é fator de atração da criminalidade”. O secretário nacional de Programas de Desenvolvimento do Turismo do Ministério do Turismo, Fábio Mota, reconheceu que a onda de violência afasta turistas. “Quem vai viajar hoje, a primeira coisa que faz é pesquisar na internet. Ele vai saber sobre o que acontece”, ponderou.
Nova Soure, Heliópolis e Itapicuru
Na nossa região, há três municípios que lideram a taxa de homicídios em 2012. O campeão é Nova Soure, com taxa de 90,67 por 100 mil habitantes. A medalha de prata ficou com Heliópolis, com 30,54. O pódio se completa com Itapicuru, com taxa levemente inferior de 30,30 homicídios. É uma guerra silenciosa.

Caldas do Jorro, Algodões, Pedra Alta, Salgadália, Pedra Vermelha e Sambaíba podem virar municípios

Caldas do Jorro
Com a aprovação do Projeto de Lei Complementar que regulamenta a criação de municípios no Brasil, a Bahia poderá ter mais 50 novas cidades. Na nossa região, de acordo com a artigo 63 da Constituição do Estado da Bahia, poderemos ter mais seis municípios, sem falar naqueles que estão se mobilizando para ver se conseguem suas emancipações. Algodões, do município de Quijingue; Pedra Alta, do Município de Araci; Pedra Vermelha, do município de Monte Santo; Salgadália, do município de Conceição de Coité; Sambaíba, do município de Itapicuru, e Caldas do Jorro, do município de Tucano podem estar bem próximos do sonho da emancipalidade.
Salgadália
Entre a aprovação pela Câmara dos Deputados, nesta terça-feira (4), do Projeto de Lei Complementar 416/08, do Senado, que regulamenta a criação de municípios, e a materialização de novas cidades baianas há ainda um longo caminho. Apesar de a Constituição do Estado da Bahia, de 1989, prever a alteração de limites territoriais e o desmembramento de municípios para a constituição de outros, a entrada em vigor da nova lei não implica o surgimento imediato das 50 cidades mencionadas na Carta Magna estadual. “Esses municípios foram inseridos na Constituição Estadual e não quer dizer que eles passarão a existir porque foram criados com base em outros critérios”, afirmou o advogado Ademir Ismerim, em entrevista ao Bahia Notícias. Segundo ele, “a realidade era outra quando essa disposição transitória foi aprovada”. Ele cita como exemplo o fato de que “naquela época, os estados tinham autonomia para criar” e lembra que o texto aprovado pela Câmara e que segue para o Senado estabelece critérios para a fundação de novas unidades federativas. Um deles é a viabilidade de emancipação da localidade, que engloba questões financeiras, político-administrativas e sócio-ambientais.
Pedra Alta
Algodões
Ismerim ressalta que o texto da nova lei “veda a criação de municípios novos quando inviabilizar os atuais” e define uma “população mínima de sete mil habitantes” para que distritos da região Nordeste possam pleitear a emancipação. “E metade desses sete mil tem que ser de eleitores”, complementa o especialista. Além disso, será necessária realização de um plebiscito, do qual participará toda a população do “município-mãe”, para aprovar o desmembramento. “Pode ser que a Assembleia verifique que todos esses municípios [citados na Constituição da Bahia] atendem a esses novos critérios, mas no meu entendimento é preciso que o processo comece do zero”, pondera Ismerim. Segundo ele, “podem ser criados até mais do que esses 50”. De quem depende? “Com a palavra, a Assembleia Legislativa”, resume o jurista. O número de municípios brasileiros saltou de 4.491 para 5.507, entre 1991 e 1996, quando uma emenda à Constituição proibiu a criação pelas casas legislativas dos estados. Ou seja, mais de 22% das municipalidades do País foram fundadas no curto período de cinco anos. Outras cidades baianas que podem ser divididas e ter seus principais povoados como municípios. Os povoados que podem emancipar-se são Stela Dubois, desmembrada do município de Jaguaquara; Rômulo Almeida, dos municípios de Brejões e Nova Itarana; Ibitira, do município de Rio do Antônio; Pirajá da Silva, do município de Itacaré; Palmira, no município de Itaju do Colônia; Irundiara, do município de Jacaraci; São Roque do Paraguaçu, do município de Maragogipe; Bela Flor, do município de Catu; Lagoa Preta, do município de Tremedal; Acupe, do município de Santo Amaro; Itamira, do município de Aporá; José Borges, do município de Curaçá; Argoim, do município de Rafael Jambeiro;; Pereira, do município de Santa Luz; Ubiraitá, do município de Andaraí; São José de Itaporã, do município de Muritiba; Caraíbas do Norte, do município de Paramirim; Inúbia, do município de Piatã; Guarani, do município de Prado; Barrolândia, do município de Belmonte; Travessão, do município de Camamu; Abrantes, do município de Camaçarí; São Manoel do Norte, dos municípios de Correntina e Jaborandi; Quaraçu, do município de Cândido Sales; Lindo Horizonte, do município de Anagé; Ibiaporá, do município de Mundo Novo; Tauape, do município de Licínio de Almeida; Bravo, do município de Serra Preta; Catolezinho, do município de Itambé; Suçuarana, do município de Tanhaçu; Lagoa Grande, do município de Cândido Sales; Espanta Gado, do município de Queimadas; Rômulo Campos, do município de Itiúba; Sítio Grande, do município de São Desidério; Missão do Aricobé, do município de Angical; Cariparé, do município de Riachão das Neves; Itabatã, do município de Mucuri; Posto da Mata, do município de Nova Viçosa; Ibirajá, do município de Itanhém; Santa Rosa do Pilar, do município de Jaguarari; Igara, do município de Senhor do Bonfim; Baixa do Palmeira, do município de Sapeaçu; João Amaro, do município de Iaçu; Gonçalo, do município de Caém; Canoanopólis, do município de Ibititá; Salobro, do município de Canarana; Catingal, do município de Manoel Vitorino; Cabrália, dos municípios de Piatã e Boninal; Iraporanga, do município de Iraquara; Inema, do município de Ilhéus; São Mateus, do município de São Gabriel e Itamarati, do município de Ibirapitanga.


Com informações complementares do Bahia Notícias e do Portal do Senado da República.

Ana Dalva não é Fabiano!

                       Landisvalth Lima
Esta semana comentava em sala o comportamento do personagem Fabiano, de Vidas Secas, romance do alagoano de Palmeiras dos índios, Graciliano Ramos. O marido de Sinhá Vitória baixa a cabeça duas vezes pelo menos: quando aceita as contas feitas pelo patrão e quando encontra o Soldado Amarelo no meio da caatinga. Neste último caso, Fabiano poderia se vingar da prisão injusta que sofreu por obra e graça do militar perdido no meio do mato. Aprendi em minha vida a respeitar o ser humano como nunca, mas minha mãe também me ensinou a nunca dar a outra face. Parafraseando outro gênio da literatura, Augusto dos Anjos, este de Sapé, na Paraíba, é preciso saber que o homem que vive nesta terra miserável entre feras, sente a inevitável necessidade de também ser fera, porque o beijo pode ser a véspera do escarro e a mão que afaga é a mesma que apedreja. Fabiano poderia ter feito tudo, menos ensinar o caminho de saída da caatinga ao soldado.
Quem foi o responsável ou a responsável pela organização da celebração da Missa das Autoridades na última segunda-feira, em festejo ao Padroeiro do Sagrado Coração de Jesus, na Igreja Matriz de Heliópolis, deve ter pensado que Ana Dalva é igual ao personagem Fabiano.  Caso não tenha lido o romance Vidas Secas, esta pessoa agiu com deselegância e foi incompetente, além de ter quebrado o protocolo. Se homem, foi ainda discriminador e preconceituoso; se mulher, também alienada e inconsequente.
Explico ao leitor: na hora da apresentação das autoridades, colocaram como representante dos vereadores Zeic Andrade, que é vice-presidente do Poder Legislativo Municipal. Até aí tudo estaria bem. Só que a presidente estava presente. Ana Dalva estava lá e ela é a representante da Câmara de Vereadores em quaisquer circunstâncias, como Ildefonso Andrade Fonseca é o representante do Poder Executivo Municipal de Heliópolis até na Cochinchina!
Não houve erro da parte do Padre celebrante. Ele não é de Heliópolis. Não sabe quais suas autoridades. Foi dado a ele um papel para ser lido. Seria provocação? Não acredito que Zeic tenha concordado com isso. Prefiro acreditar que, como marinheiro de primeira viagem que é, não tenha medido as consequências do ato. Todos sabem que Ana Dalva não era a candidata do prefeito à presidência da Câmara, mas isso ainda não foi superado? Será que um dia Ildinho aceitaria ver citado como representante do município de Heliópolis o vice-prefeito Gama Neves, mesmo o prefeito estando presente ao evento?
E não me venham com essa de lapso, porque nada foi corrigido. Ana Dalva se manteve sóbria. Não criou confusão. Ficou na dela e se comportou de acordo. Como sempre, competente como é, de postura correta, vai aguardar um pronunciamento oficial de quem promoveu a aberração. Depois pensará no que fazer. Baixar a cabeça é que ela não vai. Depois de estar na oposição praticamente sozinha por quatro anos, combatendo um desgoverno municipal perseguidor e rancoroso, construindo um lastro onde hoje transita muitos dos que estavam do lado daquele mesmo desgoverno, Ana Dalva não pode deixar passar este episódio em branco. Não pode baixar a cabeça como Fabiano. Pode até ser que alguns considerem uma besteira, mas uma fagulha também é algo insignificante e pode provocar uma grande explosão. Tem gente no governo municipal querendo brincar com fogo?
Cem mil por cabeça!
Não estou autorizado a falar em nomes de santos, mas vou contar o milagre. Um prefeito de nossa região está oferecendo 100 mil reais para cada vereador que aprovar as contas rejeitadas pelo TCM do seu antecessor e padrinho. Um vereador se negou até a conversar na possibilidade de ouvir a proposta e o valor foi dobrado imediatamente. Alguém tem dúvida onde está indo parar o dinheiro que falta a um hospital, por exemplo?
Querendo desistir!
Um político eleito de uma cidade encravada no sertão da Bahia, que pediu para não revelar o nome, disse que está cansado. Não aguenta mais tanto pede-pede de emprego, ajuda, patrocínio e outras clemências. Já pensa em renunciar. Pena que eu não estava na hora. Teria digitado imediatamente o pedido de renúncia. Há muita gente na fila querendo trabalhar. Política é a arte dos que não precisam, não querem e não desejam sossego. É tarefa para quem quer transformar a vida do povo e não a sua.
Viagem a Canudos
O professor de História do Waldir Pires, Eraldo Neves, e o professor de Língua Portuguesa e Literatura Brasileira do José Dantas, Landisvalth Lima, estão promovendo uma viagem de estudantes das duas instituições ao Parque Estadual de Canudos. A data provável será dia 15 de Junho, um sábado. A viagem será patrocinada pela Secretaria Municipal de Educação e pela Prefeitura Municipal de Heliópolis, que fornecerão os ônibus para transporte dos alunos e professores. A confirmação da data está dependendo apenas do professor Quelton Almeida, o secretário, que formalizará junto ao prefeito Idelfonso Fonseca. Estão convidados para a viagem os professores Gilberto Jacó, de Geografia, e Adilson Nobre, de História.
Sessão movimentada
A sessão ordinária da Câmara Municipal de Heliópolis da próxima segunda-feira será movimentadíssima. Ana Dalva apresentará uma nova prestação de contas e também o veículo adquirido para o parlamento, já emplacado e tudo o mais. Além disso, dará entrada em projetos de interesse da comunidade e poderá fazer seu primeiro pronunciamento da tribuna. Vem coisa por aí! Será que seria algo envolvendo denúncias feitas por ela da administração anterior, que estão sendo apuradas pelo Ministério Público, e que envolvem as empresas Beatriz Construções e Ideal Informática? Mistério!!!!               


“O Brasil é conservador, corporativista e ainda não chegou lá.”

A afirmação acima bem que poderia ser de minha autoria, mas não o é. Foram palavras ditas pelo ex-ministro da cultura de FHC, Francisco Weffort, em entrevista a Bruno Garcia, da Revista de História da Biblioteca Nacional, edição do mês de março. Um primor! Passo aqui na íntegra e vale a pena uma leitura atenta. É um soco no estômago tanto da direita como da esquerda....Perdão! Não há mais tais denominações. Diria, então, que quem tem culpa no cartório vai sentir....e muito!

Francisco Weffort: Nossos radicais são conservadores

Bruno Garcia – da Revista de História

Ex-ministro da cultura Francisco Weffort
Os rótulos fáceis da política nacional não colam em Francisco Weffort. Importante quadro do PT de Lula na primeira década do partido, tornou-se depois ministro da Cultura de Fernando Henrique Cardoso nos seus dois mandatos. Não tem saudade da política e não distingue mais esquerda ou direita no Brasil. Para ele, a disputa partidária torna as ideologias “aguadas”. Nos últimos dois governos, as coisas melhoraram, mas ainda há muito o que fazer. E, para a Cultura, o desafio é sempre o mesmo: dinheiro.
Frases inspiradas e diagnósticos sinceros não faltaram nesta entrevista para a Revista de História, concedida em seu apartamento no Rio de Janeiro. Livre do governo e da academia, Weffort define-se como um “franco-atirador”, alinhando-se a mestres como Gilberto Freyre e Sérgio Buarque de Holanda, que “escreveram o que pensaram” e com seus ensaios ajudaram a explicar a formação do país.
Autor de um clássico – O populismo na política brasileira (1978) – Weffort lançou novo livro em 2012 propondo a interpretação do Brasil como “uma sequência da Ibéria”. Como ele explica, somos um país ainda não formado – conservador, corporativista, sujeito a carências de uma “autoridade” que resolva por nós, incapaz de rupturas. Em muitos sentidos, continuamos presos ao passado, convivendo com realidades do século XVI. “O Brasil ainda não chegou, você está entendendo? O Brasil está chegando. Está indo. Mas ele ainda não chegou”. Mas dá para mapear alguns desses caminhos.
Revista de História – O senhor foi do PT e depois assumiu um ministério do PSDB. Houve algum estranhamento na época?
Francisco Weffort – Houve, houve. Mas eu conheço o Fernando Henrique desde 1956, fui aluno dele na faculdade, trabalhei com ele no Chile. E o Lula, eu vim a ter um contato mais próximo em 1977, 1978. O fato é o seguinte: eu sou um fulano da Rua Maria Antonia [antiga sede da USP] que, como vários, se aproximou da esquerda. É diferente de um cara que veio do sindicato de São Bernardo e entrou na Rua Maria Antonia, entendeu? Houve um momento em que eu me distanciei politicamente do Fernando Henrique. Ele foi do MDB para o PMDB e depois para o PSDB. Mais ou menos no mesmo período eu fui ajudar o PT. Em 1989 já estava me afastando. Você se desligar de um partido é uma coisa demorada. O Brizola chamava isso de “costear o alambrado”. Ele era boiadeiro, era caubói, para ele era tudo boi. “Costear o alambrado” é quando você está procurando um meio de cair fora. Eu estava costeando o alambrado, mas só saí em 1994. Falei com o Lula, falei com o Gilberto [Carvalho], eles entendiam, não tive problema nenhum. Mas houve um estranhamento das pessoas que não estavam na roda. Foi a melhor decisão que eu tomei em política.
RH – Por quê?
FW –Porque o ambiente era competitivo demais para o meu gosto, ou para minha ilusão quanto a um partido de teor ideológico. Mas também entendi que isso é um fenômeno tipicamente brasileiro: na hora da eleição, o seu amigo mais próximo de ideias é o seu pior adversário, porque ele vai disputar o mesmo público. A ideologia vai aguando e, no fim, isso cansa.
RH – O corporativismo sindical do fim da ditadura influenciou nosso sistema político?
FW –Eu diria que sim. As leis sindicais pelo lado dos trabalhadores têm uma influência de tipo corporativista que repercute no meio político, e isso aumentou por causa do Lula e do PT. Mas o corporativismo é uma marca da nossa política. No Congresso você tem diferentes bancadas segundo interesses corporativos. Eles se juntam para fazer a regulamentação da lei X ou Y, que incide sobre seus interesses. A mais conhecida é a bancada ruralista. Tem a corporação dos banqueiros, tem a das igrejas evangélicas. Todas essas corporações cortam a representação política brasileira. Os partidos praticamente se diluem.
RH – Existem diferenças claras entre esquerda e direita?
FW – Claro que os interesses ruralistas são, em princípio, de direita. Mas não são ideológicos. Eles estão defendendo lá a metragem de não sei o quê, como é que fica a estrada federal em relação à propriedade, os impostos. Não existem mais esquerda e direita genéricas: socialistas e comunistas na esquerda, liberais e fascistas na direita. Isso só existe no plano da convicção individual. Algumas pessoas são verdadeiramente socialistas, mas se você me perguntar se o que fazem na política caminha nesse sentido, eu não vejo. O cara pode ser comunista administrando a Fifa?
RH – Não pode?
FW – Não dá para ser comunista no futebol. A relação entre o PCdoB e a administração do esporte nacional é uma prestação de serviço. Tudo bem, eu acho ótimo que trabalhem, mas não venham me dizer que aquilo está a serviço da causa comunista. Significa que o cara não tem convicção comunista? Tem, mas não é a ação política dele. É assim também entre os liberais, entre os democratas em geral. O mundo da convicção ideológica individual já não é o mundo das grandes convicções partidárias.
RH – E um cientista político consegue exercer a política com coerência?
FW – Olha, há uma congruência de princípios gerais. Mas na administração pública, em qualquer função em que você estiver, tem que resolver problemas práticos que, em geral, são urgentes. O que você mobiliza da sua concepção geral da sociedade para trabalhar nesses problemas é pouco. Honestamente, é muito pouco. Tem que resolver o que der para resolver com os recursos que você tem. No caso do Ministério da Cultura, eu fiz muita biblioteca pública. Mas quando você vê o mapa do Brasil e os seus 5.500 municípios, sendo que mais da metade não tem nenhuma biblioteca pública, o que foi feito foi pouco, entendeu? Há uma tensão permanente entre o que você concebe de maneira genérica sobre o país e o que você é capaz de fazer item por item. Você tem que divulgar a música erudita, por hipótese. Mas custa caro. Não dá para fazer uma orquestra sinfônica, ou reforçar a orquestra sinfônica, com o salário de miséria que os músicos têm. Mas qualquer pessoa em função pública, desde que tenha uma intenção honesta, sempre consegue fazer alguma coisa.
RH – Quando o senhor assumiu a pasta, quais eram os grandes desafios?
FW – O maior desafio era o que é hoje o maior desafio: dinheiro. Você sempre consegue aumentar os recursos: eu consegui mais, o [Gilberto] Gil, que veio depois, também conseguiu. E ainda é pouco. O patrimônio histórico melhorou, mas está melhorando desde 1930, para não falar do período imperial. Ainda assim, há problemas de patrimônio óbvios. É só ir ao Rio de Janeiro histórico e você vê: casas do século XVIII, XIX desmoronando, árvore subindo do teto, na laje. Você tem que estimular a área da leitura. Ela existe, mas muito mais impulsionada pelas editoras do que pelo serviço público. Em música, há toda uma discussão sobre o que o poder público paga e o que não paga, mas tem que ter programa de estímulo à música. A música erudita, o teatro, o cinema... cada lugar progride, e ainda assim há carências muito grandes. Era a mesma coisa na minha época.
RH – Há quem critique a própria existência de um Ministério da Cultura pelo risco de dirigismo político. O Ministério da Cultura é, de fato, essencial?
FW – Não vai resolver tudo, mas é importante. Se não tivesse, seria pior. Você vai dizer: “A política do cinema é paternalista”. Se for paternalista, vamos corrigir este aspecto. Mas não pode acabar. Se a França, que tem uma tradição cultural muito maior do que a nossa, tem um Ministério da Cultura, por que o Brasil não pode ter? A cultura tem que ser concebida como investimento de Estado, do mesmo modo que a educação, que a saúde. O cinema francês, em certa época, dava mais lucro do que a indústria. A Brigitte Bardot trouxe mais dinheiro para a França do que a Renault. Por que não? Eu acho que é possível.
RH – O que o levou a estudar ciências sociais?
FW – Sou do interior do estado e minha família tinha mudado para Santos, onde ficamos um ano. Tive uma possibilidade de trabalho como “foca” [jornalista iniciante] de jornal, no Diário de Santos, e isso me aproximou de leituras de significado social: Jorge Amado, romancistas russos, temas que, na minha cabeça e na de muita gente, tinham um significado. Estudar ciências sociais tinha relação com este mundo de ideias. A universidade para mim foi um início de conhecimento sobre o Brasil. A minha época é a época de uma influência muito forte de Sérgio Buarque [de Holanda], Gilberto Freyre, Caio Prado Júnior e um grande conservador daquele tempo: Oliveira Viana. Além das teorias típicas da academia: Max Weber, Durkheim, Marx, influências trazidas por Florestan Fernandes. Eu sempre fiquei nesse veio, com o olho nos temas da política e da história política.
RH – Logo após se formar, saiu do país?
FW – Eu terminei o curso em 1961, 1962, por aí. Então, fui convidado para a cadeira de Política, trabalhei lá [na USP] um período e depois fui para o Chile, em 1964, com o Fernando Henrique. Vários brasileiros foram para lá naquele período. Eu fui não por razões políticas, aproveitei a onda. Ficamos quatro anos lá.
RH – No que trabalharam?
FW – Era no Ilpes, Instituto Latino-Americano de Estudos de Planejamento Social, ligado à Cepal [Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe]. Trabalhávamos como uma espécie de assessoria de sociologia, de história social: os economistas da Cepal eram chamados para fazer programas de ação econômica em diferentes países, e os assessores tratavam dos aspectos sociais da proposta. Nós éramos um complemento.
RH – Um pouco depois o senhor lançou um livro clássico sobre populismo [O populismo na Política Brasileira, 1978]. O que o atraiu mais neste assunto?
FW – Na verdade, eu comecei a estudar o populismo como aluno da universidade, com minha professora-orientadora, a Paula Beiguelman. Na eleição de 1962, em São Paulo, disputavam Adhemar de Barros e Jânio Quadros. Eu fiz uma pequena tentativa de entrevistar pessoas, sem nenhuma pretensão estatística. Foi o que me levou a uma primeira abordagem do tema populismo. Que sempre foi polêmico.
RH – Por quê?
FW – A avaliação do populismo sempre teve uma conotação crítica na apreciação de alguns e uma conotação de autoelogio, digamos assim, na interpretação de outros. Quando Adhemar de Barros fez campanha em São Paulo aliado ao Getulio [Vargas], na eleição de 1954, a coligação dele se chamava Aliança Populista. Não sei onde foi que ele pegou essa palavra, mas tinha a conotação de aproximação do povo. Evidentemente, para o pessoal da UDN, que combatia o Getulio, tinha uma conotação crítica. Mais adiante, no Chile, a temática do populismo também chamou a nossa atenção porque, com o regime militar, supostamente tinha terminado a época populista no Brasil. Também na Argentina, também no Peru, ou seja, havia um interesse mais ou menos generalizado. Daí é que fui escrever esse trabalho sobre o populismo, minha tese de doutorado, que apresentei em 1968.
RH – Quais são as características marcantes do pensamento político brasileiro?
FW – Um traço peculiar é a inquietação com o tema social. Isto existe desde [padre José de] Anchieta, Manuel da Nóbrega, padre Antonio Vieira. O que é que nós vamos fazer com os índios? O que é que nós vamos fazer com os negros? Metade do Brasil é de origem africana, talvez até mais. Hoje se discutem as cotas. Esta é uma inquietação sobre o social, neste país que tem tanto pobre. O Sarney é um homem de orientação social? Não sei, mas o governo dele tinha um slogan que dizia: “Tudo pelo social”. O Getulio tinha uma preocupação com o social? Tinha. Provavelmente, Pedro II também. Outro aspecto que acho muito importante é o problema da autoridade. Um artista de cinema argentino que está na onda agora, de O segredo dos seus olhos [Ricardo Darín], entrou em uma polêmica com a presidente [Cristina Kirchner]. Ele disse que a Argentina é um país niño, um país criança, que precisa sempre de alguém para resolver os seus problemas. Interessante um argentino dizer isso, porque não é o que a gente pensa da Argentina. É o que pensamos do Brasil. Precisamos de alguém para resolver, não é isso? Fulano resolve, fulano faz, nós precisamos dele. É o fenômeno da definição da autoridade, da relação de mando e obediência.
RH – Predomina o pensamento conservador?
FW – Ele é predominante. Nós todos somos, de alguma maneira, conservadores. Estamos comprometidos com certos aspectos da tradição. Tem muita gente que diz “Ah, eu quero romper”, mas rompe só na casa dele. Na política e na sociedade não estou vendo ninguém rompendo nada. Pelo contrário: o Brasil é de uma continuidade histórica surpreendente. Mesmo as pessoas que têm mais coragem intelectual admitem que algumas coisas são assim. O padre Antonio Vieira era uma figura genial do Brasil daquela época [século XVII]. Pois bem, o Quilombo dos Palmares durou quase 80 anos, era uma guerra permanente, então o rei de Portugal pediu uma consulta ao padre Antonio Vieira. O que fazer com o Quilombo dos Palmares? E o Vieira disse o seguinte: “Uma das soluções que se pode pensar é dar aos negros de Palmares a mesma liberdade que nós estamos dando aos índios”, ou seja, a de formar suas aldeias com administração dos padres, o que era uma coisa muito conciliadora dos jesuítas com os índios. “Mas se fizermos isso com os de Palmares, vamos ter que fazer isso com todos os outros, e aí a colônia brasileira não vai poder existir, pois só existe com trabalho negro e escravo”. É um pensamento basicamente conservador. Outros sermões do Vieira são de um radicalismo social espantoso, ele estava lutando por uma maior igualdade social, por uma maior justiça humana. Mas quando chega a hora do vamos ver, era essa a opinião que ele tinha. Getulio era um conservador? Era, mas ele mudou o Brasil. Muda, mas não quer rupturas. Nesse sentido, o radical brasileiro também é um conservador, porque quer uma ruptura que só existe na retórica.
RH – No seu último livro [Espada, cobiça e fé, 2012], o senhor se dedica a estudar o século XVI. Como ele ajuda a compreender o presente?
FW – O Brasil é uma sociedade ainda em processo de formação. Tem 40 milhões de pessoas aqui que não estão no mercado. Você não pode ter uma sociedade moderna com tanta gente recebendo bolsa-família. Muita gente está no século XVI ainda. Estamos até agora discutindo o que fazemos com as terras dos quilombos. Se o brasileiro mais moderno pegar um carro no Rio e sair em boa velocidade para o interior do estado, ele vai encontrar o século XIX, o século XVIII, vai afundando e vai afundando. Chega um momento em que ele para porque não tem nem coragem de ir mais. O Brasil tem coisas muito modernas e avançou, mas ainda está no passado. Conhecer esse passado é importante para se ter uma ideia de como mudar o presente. Esta é a primeira coisa. A segunda coisa é a minha experiência pessoal no Ministério da Cultura.
RH – Ela mudou a sua visão do Brasil?
FW – Eu vi mais Brasil no Ministério da Cultura do que jamais veria até o fim da minha vida. Quando você afunda pelo Centro-Oeste, o Norte, o Amazonas, vê que é realmente um mundo enorme. Os primeiros grandes intérpretes do Brasil, especialmente o Caio Prado Júnior, o [Roberto] Simonsen, tinham uma interpretação correta, mas carregavam na ênfase do Sul-Sudeste. A obra magnífica do Gilberto Freyre projeta uma visão nacional, mas é basicamente o Nordeste. Você tem que juntar essas influências de várias origens numa visão mais ampla do Brasil de hoje.
RH – No livro, o senhor usa bastante a expressão “conquista”, muito mais vista na América espanhola do que no Brasil. Por que esta opção?
FW – O Brasil que conhecemos, esse mapa enorme, foi construído ao longo de um século e meio, quase dois séculos. A conquista do território é selvagem, brutal, no mesmo sentido da conquista e da reconquista da Ibéria. E com o mesmo tipo de gente. Eles avançavam para conquistar terras para o rei, em troca de benesses e favores. Esta era uma mentalidade medieval. O Brasil é isso: uma sequência da Ibéria. E os portugueses não encontraram as riquezas que Cortez encontrou no México logo na chegada, ou o que o outro, Pizarro, em poucos anos achou no Peru. Aqui, eles levaram um século e meio para encontrar as minas. A gente fala Minas Gerais como se Minas Gerais estivesse ali desde sempre. Minas Gerais começa no fim do século XVII. A conquista do território significou a luta pelo domínio sobre os índios, ou seja, é conquista mesmo.
RH – E hoje? O senhor se mantém próximo da universidade?
FW – Não, o contato é meramente o de professor-colaborador. Eu tive um contato muito intenso durante 35 anos, mas depois do ministério eu já voltei aposentado. A universidade é um mundo cultural próprio, à parte. A atividade do professor é voltada para sua turma de estudantes, para o curso, para a faculdade onde tem determinados títulos de carreira a conquistar. A atividade do franco-atirador na vida intelectual é diferente: você faz conferências, escreve artigos, escreve livros, mas visa a um público muito mais geral. Na época dos intérpretes do Brasil, Caio Prado não estava na universidade, Sérgio Buarque era jornalista na Alemanha e veio para o Brasil depois da Revolução de 1930. Quando escreveu Raízes do Brasil, não tinha uma carreira universitária brasileira ainda. O Gilberto Freyre tinha uma atividade intelectual, mas não era tipicamente uma atividade universitária. Escreveram aquilo que pensaram, não tinham um público predefinido. E ajudaram a formar essa gente toda. Hoje você pode se balizar, ao escrever sobre a história do Brasil, nesse estilo que é puramente um ensaio.
RH – Qual é o papel do intelectual atualmente
FW – É se colocar o mesmo tipo de problemática que eles se colocaram: como é que este país se formou. Como é que chegamos ao que somos. A obra mais importante de Antônio Cândido é Formação da literatura brasileira. A obra mais importante do Caio Prado é A formação do Brasil contemporâneo – Colônia. O mesmo para o Gilberto, para o Sérgio Buarque. O papel do intelectual de hoje é tentar fazer o que eles fizeram. Não repetir, mas tentar fazer no mesmo estilo. Precisa ter coragem, porque não é fácil. E competência.